O TEU PIÉR (Part 1)
- Ana Meira
- 11 de out. de 2018
- 3 min de leitura

Ainda estou sentada aqui. Não sei para qual lado continuar a caminhar, pareceu sujestivo sentar e esperar algo acontecer. Por trás de toda essa confusão o vento parece conversar com os meus cabelos. A pele acostumou com todos os tapas que a ventania deixou pelo meu rosto, ela vai e volta e não consigo mais mover-me. É como se cada sufoco, cada conflito estivesse segurando minhas mãos sobre as beiradas da madeira; o mar sempre foi um infinito que deixou-me confusa. A minha inspiração cria um cerco em meu peito, sem teclado, sem lápis. Apenas os meus dedos que espremem-se nessa madeira, controlando que tudo exploda e transborde.
Apesar do mar estar alguns centímetros abaixo dos meus pés é dentro da minha alma bagunçada que tenho tentado não afogar. Um temporal sentimental fez abrigo em meu ser já faz algum tempo. A carne briga incessantemente. Poderia tocar uma orquestra e Mozart pareceria alegre perto das canções que tem tocado aqui dentro. Sentia o ar indo embora dos meus pulmões e a morte golpeando todos os meus alicerces. Estava pronta para entregar todos meus pontos, o vento não era confortante - era meu agressor e eu não sabia como desapegar-me da dor. Estava sentindo um frio ensurdecedor no meu âmago gritar com o medo cantarolando aos pés dos meus ouvidos: “covarde covarde”. Eu vou pular desse abismo e desistir. Dizia para mim mesma. Desistir da bondade, de confiar, entregar... Queria olhar pela última vez, olhar para qualquer coisa e ver beleza, mas, ela tem tornado-se ambígua.
A água estava gelada e ela fazia as pontas dos meus dedos doerem. Fiquei um bom tempo fazendo esse joguinho de colocar e tirá-los. Depois de um tempo era gostoso sentir a água gelada. Era início de tarde, estava um pouco frio e eu não estava feliz com o sol que começava a nascer. Olhei pra cima forçando meus olhos a encarar a luz que surgia por detrás das nuvens, queria fulmina-lá por expulsar meu céu nublado. O sol fazia com que algo dentro de mim pedisse por energia e determinação, eu não estava afim de viver em picos de necessidades e felicidades naquele momento. Não tinha paciência comigo mesma. Eu ainda estava olhando fixamente para o céu quando ao desistir de brigar com o tempo, eu o vi. Ele parecia irritante de leve, o vento brincava com seus cabelos, suas mãos estavam cruzadas e cotovelos apoiados no cais, enquanto seu rosto inclinavam-se para o céu, sorrindo. Sorrindo! Senti vergonha debochar da minha cara, parecia que meus ombros doíam de tanto peso. Minha mente brigava com meus olhos. Eu invejava aquela leveza. Foi quando os meus olhos se perderam nos seus pela primeira vez. O seu castanho parecia sorrir para os meus e em um presente remoto eu poderia ser completamente deles. Eu queria mergulhar e conhecer cada um dos seus olhares. Sei que poderia entregar-me para cada mistério que ele já viveu. No entanto a minha carga estava cansada, eu queria desistir. Queria tanto não lutar. Estava cansada de brigar, de aguentar. Fiquei hipnotizava por segundos que pareceram minutos, até perder-me novamente para as pontas dos dedos dos meus pés na água. Eu estava com vergonha de ter sido pega encarando-o. Ainda podia sentir seus olhos fixos em mim e continuei portando-me como se ele não existisse. Era previsível como essa garota aqui dentro criava defesas, lá estava eu sabotando minhas emoções, novamente. Mais uma vez dizendo que não merecia sentimentos bons. Rendi-me a solidão e todo o meu silêncio dizia tanto - eu apenas escutava-o. Não sabia mais como respirar, não sabia como dizer para ele parar. Eu comecei a borbulhar quando senti o barulho da madeira intensificar perto de mim, alguém estava aproximando. Pude ver-me jogada dentro daquelas águas, assisti cada parte minha perder o ar dos pulmões, sendo desfeita e entregando as forças. Eu me enxerguei fugir apenas para não dizer, para não precisar explicar, para não ser gentil. Eu me vi fazer... até olha-lo de pertinho pela primeira vez. Seu rosto estava na frente da luz, o que o deixava ainda mais bonito. Então percebi que havia começado a afogar-me. Meu coração palpitava e eu não sabia o porque. Era muita água e eu não sabia como lutar, não sabia como respirava. “Expira” (dizia para mim mesma). Estava afogando-me inteira dentro dele. Seu olhar era um rio inteiro em que eu perderia-me facilmente apenas com uma palavra dos seus lábios.
Um vendaval de pureza o acompanhava, não sabia como não olhar, para aquele sorriso que formava em seus lábios, nas mãos que se estendia para acenar em minha frente. O que ele tinha de tão especial em seus olhos que roubou todo o meu silêncio? Apertei as pálpebras com força, como se eu fosse conseguir fazê-los explodir. Na verdade, apenas queria voltar a respirar e fechar os olhos levava-me a esconder daquele homem parado na minha frente - sorrindo, me encarando. Eu queria não estar hipnotizada mesmo não o enxergando.
(Continua)
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